Reproduzo artigo publicado
no Consultor Jurídico
AP 470
"STF aplicou domínio
do fato de forma grotesca"“A teoria do domínio do fato tem sido aplicada de maneira chula pelo Supremo Tribunal Federal.” A declaração é do criminalista Andrei Zenkner Schmidt, professor de Direito Penal da PUC do Rio Grande do Sul. Para ele, a teoria “é muito simples”, mas teve seu uso desvirtuado pelo STF durante o julgamento da Ação Penal 470 para se tornar uma forma de evitar o “óbice da condenação por falta de provas”.
Zenkner é um advogado
experiente quando o assunto é o uso de teorias de Direito Penal com o objetivo
de condenar. Entre seus clientes está o banqueiro Daniel Dantas, um dos
acusados na ação penal que decorreu da operação satiagraha, da Polícia Federal.
A briga de Dantas e seus advogados com o Ministério Público e com o Judiciário
ficou famosa: a operação, e as provas por ela recolhidas, foram anuladas pelo
Superior Tribunal de Justiça por ilegalidades durante as apurações.
Mas antes de chegar ao STJ,
o banqueiro amargou uma dura batalha com o juiz federal Fausto De Sanctis,
então titular da 6ª Vara Federal Criminal e hoje desembargador no Tribunal
Regional Federal da 3ª Região. De Sanctis chegou a ter brigas públicas com
ministros do Supremo que suspendiam suas ordens de prisão. Ficaram famosos os
casos do ministro Gilmar Mendes e Eros Grau.
A crítica ao Supremo
durante o julgamento do mensalão foi feita durante palestra em Campos do Jordão
(SP), no IV Encontro Anual da Aasp, que faz 70 anos em 2013. Sua principal
reclamação foi por causa do que considerou uma distorção à teoria do domínio do
fato. Na opinião do criminalista, “a teoria do domínio do fato foi usada como
uma norma de Direito Processual Penal, para questões de ônus da prova.
Transportou-se para o Direito Processual Penal uma teoria do Direito Penal; uma
maneira estelionatária de lidar com o problema [da falta de provas]”.
Zenkner afirma que, “na
verdade, a teoria do domínio do fato é muito simples”. Ele conta que ela foi
desenvolvida pelo penalista alemão Claus Roxin num momento em que os crimes do
nazismo começavam a ser julgados. A intenção dele, lembra o advogado, era
evitar que os dirigentes do partido, os que estavam no comando, fossem
condenados como partícipes, “uma responsabilização menor dentro da esfera
penal”, disse Zenkner.
Portanto, continuou, a
teoria do domínio do fato foi a forma encontrada pela academia para tratar o
mandante que não faz parte da execução de uma forma diferente da exposta pelo
Direito Penal clássico. “Mas isso não quer dizer que se exclui a necessidade de
prova. A teoria diz de forma bem clara que é preciso encontrar alguma prova
concreta de que houve o mando, como uma assinatura, uma troca de e-mails, uma
conversa telefônica grampeada etc. Hoje em dia os meios de prova estão muito
diversificados.”
No entendimento de Zenkner,
o que o Supremo fez durante o mensalão foi se apropriar da teoria e distorcê-la
para dizer que “o simples fato de alguém estar lá e ter um posto de comando e
poder de decisão é suficiente para a condenação”. A teoria foi usada pelo STF,
no caso da AP 470, para o advogado, como uma forma de “acabar com o processo
penal para se chegar a um resultado pretendido”. “Essa é a forma grotesca com
que ela foi aplicada pelo mensalão.”
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